Ouvi pela primeira vez o termo “Povos da Floresta”, quando, em junho de 1987, em visita a Mary Allegretti, Doutora, Antropóloga do Instituto de Estudos Amazônicos, – que, ainda hoje conduz um trabalho fundamental de assessoria ao Conselho Nacional do Seringueiros e ao Sindicato Rural dos Trabalhadores do município de Xapurí – Acre, onde Chico Mendes, – que nesta época já havia ganho dois importantes prêmios internacionais de reconhecimento pela defesa da floresta em pé, Raimundão, Jaime Barbosa e muitos outros seringueiros resistiam por meio de empates à derrubada da floresta pelos agropecuaristas migrantes do sul do Brasil.
Empates eram impedimentos pacíficos por parte dos seringueiros, que tentavam evitar a derrubada das florestas, necessárias para sua sobrevivência econômica. Estudante à época, fiquei fascinado quando ganhei de Mary, naquela reunião, um convite para uma viagem de estudos aos seringais de Xapuri. Claro que aceitei. Foram quatro dias e quatro noites de ônibus somente para se chegar ao destino.
Guma, o Gomercindo Rodrigues, foi nosso guia. Ele foi fundamental na construção de ideia de cooperativa e na consolidação associativa dos seringueiros. Pude então, durante vintes dias na mata, conhecer as principais lideranças do movimento dos seringueiros à época, e participar em cada colocação dentro da floresta, de reuniões para discutir a proposta de criação das reservas extrativistas que somente seriam efetivadas no ano 2000.
Nas conversas inesquecíveis com os mais idosos, me inspirei no vasto etnoconhecimento deles, sobre a utilização da biodiversidade da floresta. Lá, compreendi que o termo “florestania”, era bem apropriado, pois este conhecimento originário, tem um potencial econômico que quatro décadas depois, se consolidara com o nome de bioeconomia.
Na semana do meio ambiente de 2024, o Ministério de Meio Ambiente de Mudanças Climática lançou por meio do Decreto N 12.044, a Estratégia Nacional de Bioeconomia, que apresenta diretrizes e objetivos estratégicos para o desenvolvimento de cadeias de produtos, processos e serviços que utilizam recursos biológicos e tecnologia avançada para elaboração de produtos mais sustentáveis, favorecendo que povos da floresta, possam manter seu modo tradicional de vida, utilizando-se de recursos do conhecimento tradicional sobre a biodiversidade de cada bioma.
O Decreto integra ações conjuntas dos ministérios do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Meio Ambiente e Mudança do Clima e Fazenda. Esta iniciativa que integra do Plano Nacional em Bioeconomia, não poderia chegar em bom tempo para os seringueiros de Xapuri, bem como dos extrativistas de todo o país.
Após recentes anos marcadamente constituídos de um retrocesso nas leis ambientais, que implicaram em um desmantelamento de todo o avanço conquistado por estes povos da floresta, há agora uma expectativa que processos e diretrizes considerem estas associações extrativistas, fomentadores de um novo conceito de economia que mantem a conservação da floresta biodiversa e valora seus conhecimentos tradicionais por meio do uso sustentável, conservação e a valorização da biodiversidade, a descarbonização dos processos produtivos.
Para esta próxima etapa, do planejamento, tem que se ouvir os legítimos atores desta agenda, traçar cenários de médio e longo prazo, ganhando agilidade e escala para que este plano, se transforme em uma grande ferramenta envolvendo os povos da floresta e extrativistas dos demais biomas brasileiros na gestão econômico -sustentável de seus territórios.
Roberto Xavier de Lima – Diretor de Planejamento e Inovação da Neotrópica Sustentabilidade Ambiental, mestre em conservação da natureza, biólogo, escritor.
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